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"Não dá mais para viver de música", diz líder do Dokken

19 out 2013 - 09h00
(atualizado às 09h00)
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O músico americano Don Dokken, em 2006
O músico americano Don Dokken, em 2006
Foto: Getty Images

Formado no final dos anos 1970 na Califórnia, o Dokken viveu a efervescência do heavy metal e hard rock, que ganhou popularidade na década seguinte. Mais de 30 anos se passaram desde que Don Dokken (vocal), George Lynch (guitarra), Juan Croucier (baixo) e Mick Brown (bateria) lançaram os primeiros trabalhos, e muita coisa mudou no mercado fonográfico desde então. Prestes a se apresentar no festival Monsters of Rock, neste domingo (20), na capital paulista, Don Dokken falou ao Terra sobre as conturbadas fases de brigas e hiatos do grupo, além da situação atual do público em relação ao gênero.

“O que mudou é que não dá mais para viver de música. Antes, você fazia um disco, trabalhava pra cacete nele, gastava todo o seu dinheiro, fazia um bom disco, vendia e pagava o seu aluguel. Agora, você faz um disco, ele chega à internet na segunda-feira e na terça todo mundo já o está baixando de graça. Então é difícil para essas novas bandas ficarem motivadas a trabalhar com música, porque não dá mais pra viver”, disse o vocalista, que subirá ao palco do festival ao lado da atual formação da banda, que conta com Mick Brown (bateria),  Jon Levin (guitarra), Sean McNabb (baixo).

Confira abaixo a entrevista completa.

Terra - Em 1988, o Dokken foi uma das atrações principais do Monsters of Rock Tour, giro norte-americano com bandas como Metallica, Scorpions e Van Halen. Agora, vocês estão de volta ao festival, lendário na segunda metade da década de 1990 no Brasil, com show neste mês em São Paulo. Como você vê esse retorno ao evento que se tornou uma das grandes marcas do rock pesado nas décadas passadas?

Don Dokken - Na verdade, acho que não há nenhuma importância nisso. Isso porque Monsters of Rock é apenas um nome, nada além disso. Não há conexão entre o que fizemos com o Van Halen naquela época com o festival de hoje. São bandas diferentes em locais diferentes. Teremos o Aerosmith e o Whitesnake em São Paulo, o que já mostra o quão distante é uma da outra realidade. Quero dizer, há tantos festivais em que toquei no mundo inteiro e este acaba sendo só mais um, mas com o nome de Monsters of Rock.

O Dokken encerrou suas atividades logo depois daquela turnê do festival. Como você se sentiu com a saída do guitarrista George Lynch da banda, que culminou em um hiato?

Terrível. Sabe, eu trabalhei muito duro por toda a minha vida para conseguir contratos com gravadoras, ser bem-sucedido... Estávamos ficando muito famosos, ganhando um bom dinheiro e, com George causando tantos problemas, acabamos ficando muito chateados. Tipo, 'puta merda', agora que conseguimos, que estamos aqui, vem esse cara causar um monte, discutindo, brigando, usando drogas e mais drogas, bebendo, usando esteróides. Foi vergonhoso nos ver chegando ao nível de uma banda de estádio e os caras do Scorpions, Metallica e Van Halen nos olhando e dizendo: "o que há de errado com vocês? Vocês só brigam, brigam, brigam". E eu respondendo, "alguém fale com o George...".

Esses conflitos entre você e Lynch eram tão comuns?

George e eu nunca nos demos bem desde o dia em que nos conhecemos. Nem antes de nos tornarmos famosos. Eu precisava de uma banda, mas assim que ele entrou, quando já tínhamos contrato assinado com gravadora e tudo o mais, os problemas começaram. Eu achava que ele era um grande guitarrista, algo que eu precisava. Na época, Mick (Brown, baterista do grupo) disse, "dê uma chance a ele". E eu dei, infelizmente, porque tinha certeza que, quando tivéssemos algum sucesso, conseguissemos um pouco de dinheiro, um pouco de fama, ele ficaria feliz. Mas parecia que quanto mais fama ele tinha, mais infeliz ficava. O que é muito estranho... Por que alguém ficaria mais miserável à medida em que se tornasse mais popular como guitarrista? Nunca entendi...

Na época em que ele saiu da banda, voltar com o Dokken, como você fez em 1993, já era uma prioridade?

Na verdade, não. Isso porque George pegou meu nome para ele, o que é muito estranho... Eu naturalmente queria continuar com o Dokken, mas George, Jeff e Mick disseram que eu não podia usar o nome Dokken. E eu disse, "isso é loucura! Não posso usar meu próprio nome?" . Eu nasci com esse nome, meu pai me deu esse nome... Ainda assim, os três me levaram ao tribunal e o tiraram de mim...

Como você se sentiu com isso?

Eu disse, 'por quê? Por que vocês querem tirar o nome de mim? É meu nome, eu comecei a banda, eu chamava o grupo de Dokken cinco anos antes de vocês entrarem na banda!" Mas eles o tiraram de mim. Então eu chamei o meu disco seguinte (Up from the Ashes) de Don Dokken, o que eu nunca quis, porque não era minha intenção fazer um trabalho solo. Mas aqueles idiotas de merda tomaram meu nome, então teve de ser assim.

Com tudo isso, por que vocês voltaram a tocar juntos alguns anos depois?

É simples. Em 1995, eles quiseram voltar a tocar comigo. E eu virei para eles e disse, "por quê? ah, sim. Porque vocês todos gastaram seu dinheiro, certo?" (risos). E eu disse, "ok. Eu volto com vocês, mas quero meu nome de volta". E foi isso.

<p>Don Dokken em 2008</p>
Don Dokken em 2008
Foto: Getty Images

E como foi a relação de vocês com o retorno? Afinal, o negócio todo resultou em tribunal...

Não foi boa. Na verdade, com Jeff e Mick tudo saiu bem, eles ficaram muito felizes com a nossa volta... Nós três fizemos um novo disco, Dysfuntional (1995), sem o George, e tudo estava tranquilo. E aí o George voltou. A gravadora falou que seria legal se estivéssemos com ele, pois teriamos todos os integrantes originais e essa coisa toda - e eu ainda disse, "acho que é um erro, porque acho que George tem sérios problemas mentais e não preciso mais disso na minha vida, pois acabarei tendo um colapso nervoso". Ainda assim, ele voltou para a banda e no começo tudo estava indo ótimo. O disco estava vendendo bem, tudo ótimo. Mas logo o George voltou a fazer bobagens e mandou a gravadora se foder. E isso, mais uma vez, nos ferrou. No dia seguinte estávamos demitidos da gravadora. 

Nesse nível?

Sim, foi exatamente dessa forma. E aquilo foi o fim. Depois, mudamos de gravadora, para a CMC, e fizemos um disco terrível, Shadowlife, com o qual não tive qualquer envolvimento... Eu ainda tentei seguir com o George, mas ele continuou nos fodendo, xingando as gravadoras, brigando com todo mundo, e então finalmente eu disse: "chega! Não consigo mais aguentar isso". Virei para  o Jeff e o Mick: "ou ele vai embora ou acabou". E foi ali que nos livramos de George e contratamos Red Beach (entre 1998 e 2001). E depois gravamos um ótimo disco (Erase the State, de 1989).

Depois de tudo isso, quais as chances de um dia voltar a tocar com Lynch?

Zero.

O rock/metal era um estilo de imensa popularidade na década de 1980, fato que ajudou bandas como o Dokken a atingir certo grau de fama. Mas músicos daquela época são unânimes em afirmar que tudo ficou muito diferente de lá para cá, desde questões como festas e drogas até o próprio mercado em geral. O que mais mudou nessas últimas três décadas?

O que mudou é que não dá mais para viver de música. Antes, você fazia um disco, trabalhava pra cacete nele, gastava todo o seu dinheiro, fazia um bom disco, vendia e pagava o seu aluguel. Agora, você faz um disco, ele chega à internet na segunda-feira e na terça todo mundo já o está baixando de graça. Então é difícil para essas novas bandas ficarem motivadas a trabalhar com música, porque não dá mais pra viver. Nós, por exemplo, somos sortudos, porque fizemos nosso pé de meia nos anos 1980 e 1990, quando ganhamos muito dinheiro. Então, hoje posso continuar tocando, porque não ligo mais para o dinheiro. Só quero tocar porque é divertido. Mas para as novas bandas deve ser muito difícil fazer sucesso quando as pessoas vão roubar seus discos dois dias depois de lançados. É preciso entender: quando uma pessoa baixa uma música e pensa, 'sou só uma pessoa baixando', não é assim, porque não é uma pessoa, são milhões delas! Olhe para bandas gigantes como o Metallica e o Aerosmith: nem elas vendem milhões de cópias mais, porque todos estão baixando suas músicas sem pagar. 

Então qual seria o futuro dessa indústria?

Bem, o rock está morto. É um fato. Mas olhe para bandas como Mumford & Sons: eles vendem milhões de discos. Justin Bieber, uma pequena criança, também; Lady Gaga, idem. Entaão é meio louco, sabe? Mas essa é a nova música nos EUA, tudo mudou. Esses artistas que citei estão lotando arenas, mas isso é música de colegial, pra crianças jovens. Já bandas como Aerosmith e Metallica são para os verdadeiros fãs. E eles estão em falta...

Mas o rock era tão imenso mercadologicamente falando. O que aconteceu?

Era ótimo! Eu realmente não sei o que houve. Nos anos 1990, com o grunge, começou o colapso: o Nirvana mudou tudo, ajudou a acabar com o hard rock. Você sabe o que aconteceu. O grunge cresceu, se tornou o grande gênero e isso meio que fodeu todo mundo dos anos 1980. Sem ofensas, mas também bandas como o Poison, com aquelas maquiagens e todas aquelas cores: aquilo não era música, era rock cartoon. Então acho que as pessoas pararam de levar o rock a sério...

Fonte: Terra
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