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Histeria sem limite de idade: veja como é o cruzeiro de Roberto Carlos

O mesmo fanatismo da Jovem Guarda deixou os festivais e se mudou para cruzeiro na décima edição do 'Emoções em Alto-Mar'

14 fev 2014 - 12h00
(atualizado em 5/11/2015 às 12h49)
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Roberto Carlos comemora 10 anos do cruzeiro 'Emoções em Alto-Mar'; veja como foi:

São 2h36 da manhã. Em um dos longos corredores do luxuoso navio MSC Preziosa duas vozes são ouvidas. É o refrão de Jesus Cristo, cantado em um tom mais ameno em função do horário avançado. “Ficamos muito longe dessa vez, mas ainda bem que deu”, diz uma delas, já com os pés descalços diretamente no carpete azul com detalhes em vermelho. Em uma mão as sandálias já deformadas após uma aparente batalha. Na outra, o punho cerrado segura firmemente o troféu conquistado: uma rosa vermelha, despedaçada. São poucas pétalas que ainda lhe dão o formato original desde que saíram das mãos de quem a enviou para essa senhora.

A cena pode parecer incomum, mas é um retrato diário da rotina a bordo do Emoções em Alto Mar, cruzeiro temático comandado por Roberto Carlos que completou dez anos de existência em 2014. Entre os dias 8 e 12 de fevereiro, mais de quatro mil seguidores, talvez a parcela mais fiel – e abastada – do cantor  “dividiram o mesmo teto”, como o próprio Rei gosta de repetir, com seu ídolo.

As fãs que outrora gritavam histericamente nos festivais da Jovem Guarda, agora saem de suas cabines luxuosas com seus vestidos brilhantes e se acotovelam na beira do palco munidas de seus smartphones e tablets para registrar o momento perto do Rei. E claro, tentar pegar uma das rosas atiradas pelo cantor.

O Terra esteve a bordo do cruzeiro durante estes quatro dias e acompanhou a rotina destas fãs que se reencontram com seus momentos da juventude fanática e lutam com unhas e dentes para voltar desta viagem se sentindo um pouco mais próximas de sua majestade.

A ida

O navio parte de Santos, litoral de São Paulo. Da capital, dezenas de ônibus saem de pontos estratégicos. Uma das principais saída é em um grande hotel na zona norte da cidade.  A aglomeração é visível e denuncia que não é um dia normal para o estabelecimento. O número de camisetas azuis logo chama atenção. Grupos fazem suas próprias estampas, geralmente com fotos de Roberto Carlos e o Estado de origem. Pernambuco, Ceará, Amapá, Rio Grande do Sul. Levaria poucos minutos para que se conseguisse reunir um representante de cada Estado nesta porção.

Roberto Carlos se apresentou na noite dessa terça-feira (11) no último dia do cruzeiro 'Emoções em Alto Mar', que celebra sua décima edição
Roberto Carlos se apresentou na noite dessa terça-feira (11) no último dia do cruzeiro 'Emoções em Alto Mar', que celebra sua décima edição
Foto: Osmar Portilho / Terra

Aos 72 anos, Roberto Carlos segue atuante, e carrega neste projeto fãs mais antigos, de quando os clássicos de hoje eram apenas apostas de ontem. A presença de jovens é escassa, mas não inexistente. Na maioria são filhos acompanhando seus pais e avós em ritual que se comprova recorrente. Antes mesmo da partida, famílias se reencontram das viagens anteriores, se abraçam e logo comentam as últimas duas, três ou quatro vezes que estiveram no cruzeiro.

No ônibus, discutem estratégias como se fosse adolescentes em busca de seu ídolo teen: “Ele sempre vai no cassino. Mas tem que ser de madrugada. Ele sempre joga roleta. A gente faz um plantãozinho”.

Devidamente munidos de smartphones de telas gigantes e tablets, amizades instantâneas surgem da forma mais natural: todos gostam de Roberto Carlos. Os aparelhos mostram fotos desfocadas e vídeos tremidos de shows do cantor. Entre uma foto e outra, uma selfie: “Meu filho não pôde vir este ano. Viemos só eu e minha mulher. Vou  avisar que está tudo bem”, diz um senhor enquanto sofre com a ausência de sinal na Serra de Santos na tentativa de enviar a imagem pelo aplicativo Whatsapp.

A chegada

O clima de reencontro se multiplica uma vez dentro da embarcação. O lobby e corredores ganham conversas sobre tudo e sobre nada. Desabafos e conversas vazias de elevador. Em algumas mesas, o primeiro sinal de empolgação surge com versos de algumas músicas, cantados em um coro desajeitado.

O clima muda quando se aproxima a hora de finalizar o check-in. O Rei é um dos últimos a embarcar. O momento chega e as varandas se lotam. Cada espaço das janelas dos corredores ganha para si uma câmera apontada para o mesmo ponto: um Lamborghini branco. O Rei acena, posa pra fotos e entra rapidamente. Os gritos explodem.

Longe de ser um cruzeiro normal

O tema é levado a sério. Caminhar pelos quase infinitos corredores do MSC Preziosa tem uma trilha sonora óbvia: Roberto Carlos. Um elevador nos leva ao deck superior, onde estão piscinas, solários, discoteca e centenas de espreguiçadeiras. No bar, a música que toca é...Adivinhe: Roberto Carlos. Canções da Jovem Guarda, de sua fase romântica e amostras de toda a carreira do cantor inundam o perímetro da embarcação. Aqui todos respiram Roberto Carlos, e querem que assim seja.

Coletiva

Entrevistas coletivas são oportunidades de artistas requisitados de conversar com vários jornalistas de uma vez só. No caso do cruzeiro de Roberto Carlos, fãs que são sorteados podem acompanhar o evento. O que seria simplesmente uma sessão de “pergunta/resposta” ganha tom de jogo de futebol. Uma pergunta um pouco mais pesada de um repórter pode causar um receio entre os fãs, que olham torto para aqueles que “ameaçam” seu ídolo. Na contramão, uma resposta firme ou carismática do Rei é aplaudida e reverenciada por seus súditos.

“Esse quase sou eu”

A frase é do ator Carlos Miele, apresentador de diversas atrações do cruzeiro ao se referir a um dos sósias no barco, mais especificamente Robson Carlos. O corte de cabelo impecavelmente copiado, camiseta azul, calças e tênis brancos. O óculos aviador pendurado na camiseta e o jeito de falar já conhecido: “Pô, bicho”. Eles estão por todos os lados, sempre rigorosamente caraterizados  e arrastam por sua conta sua própria porção de fãs, que tiram fotos e aproveitam a presença por lá. Robson Carlos, que também canta, distribui cartões e aproveita a oportunidade para divulgar seu trabalho como sósia para o público mais certeiro na sua especialidade. Para quem pensa que o sósia é convidado e uma atração extra do navio, o engano: ele paga tudo do próprio bolso.

Roberto Carlos concedeu uma entrevista coletiva, neste domingo (8), à bordo do MSC Preziosa
Roberto Carlos concedeu uma entrevista coletiva, neste domingo (8), à bordo do MSC Preziosa
Foto: Osmar Portilho / Terra

Aparições

Os rumores correm pelos corredores, restaurantes e na piscina: “Roberto vai aparecer não sei onde”.  Vivendo sob o mesmo teto de seus seguidores mais fiéis, o cantor vai de encontro ao público e prestigia atrações do navio escolhidas por ele mesmo, como a palestra da sexóloga Laura Muller e o show do humorista Tom Cavalcante. Em  ambas as situações, houve um atraso que nem precisou ser justificado. “É culpa dele. Sempre que ele vai aparecer, atrasa”, disse uma fã na quinta fileira. O tom é mais esperançoso do que de cobrança. A cortina lateral se abre e Roberto aparece com o figurino mais casual possível: calça e camiseta. Ele segue para uma das poltronas na parte mais próxima do palco, sempre ao lado de seu empresário, Dody Sirena.

A atenção do palco se divide agora com as câmeras que tentam aplicar o zoom em meio a escuridão do teatro para tentar fotografar nem que seja a parte anterior da cabeça do cantor. Senhoras se apoiam nos encostos dos bancos da frente, esticam os braços com suas câmeras. Tentam alcançá-lo de qualquer maneira possível.

Parte do cronograma, o karaokê é realizado no último dia, na parte da tarde. Fãs que querem se arriscar com as canções de seu ídolo colocam seus nomes em fichas em uma urna. Os sorteados ganham a chance de soltar a voz com a própria banda de RC. O resultado, obviamente, ora é desastroso, ora impressionante.

Em 2014, o vencedor foi um equatoriano, que soltou a voz e impressionou o Rei, que compareceu para prestigiar a competição e entregar os troféus. O destaque também ficou por conta da segunda colocada, que ganhou um abraço apertado do cantor e mais uma dança que não estava no script.

A tal aparição de Roberto Carlos no cassino durante a madrugada não se concretizou por questões de logística, já que a mobilização com o cantor seria intensa no local. Outro momento programado seria um pocket show durante o baile de gala. O Rei chegou a ensaiar algumas músicas, mas com tantos compromissos temeu que sua voz ficasse prejudicada para o último dia de cruzeiro.

Concorrentes

Um páreo duro. Em um cruzeiro lotado com fanáticos por Roberto Carlos, ser uma atração musical paralela não é nada fácil. Mas a leveza do público faz com que os diversos ambientes do cruzeiro recebam apresentações competentes que vão da MPB ao rock, como os elogiados shows da banda Dublê. O próprio apresentador Luís Carlos Miele fez uma série de apresentações com piano e voz. “Eu falei que o Roberto é um cara peitudo. Ele vai lá e marca o show dele pro mesmo horário que o meu? E vai que o dele fica vazio, né? Mas disseram que até que foi bem. Bom pra ele”, brincou o bem humorado apresentador, mestre de cerimônias de diversas atividades no navio.

Hora do show

O clima antes das apresentações mudava drasticamente o ambiente dos corredores do MSC Preziosa. Uma rápida caminhada pelos corredores revelava o barulho constante dos chuveiros das cabines e conversas empolgadas. Os maiôs largos e chapéus desajeitados vistos durante o dia nas piscinas davam lugar a vestidos longos, brilhos e joias. O cheiro dos protetores solares em spray usados repetidas vezes desaparece. O rastro que conduz para o sexto andar, na entrada do teatro, é dominado por fragrâncias cítricas, doces, suaves, fortes e todas as combinações possíveis num emaranhado de perfumes.

Roberto Carlos se apresentou no MSC Preziosa para celebrar a décima edição de seu cruzeiro, o Emoções em Alto Mar, no início da madrugada desta segunda-feira
Roberto Carlos se apresentou no MSC Preziosa para celebrar a décima edição de seu cruzeiro, o Emoções em Alto Mar, no início da madrugada desta segunda-feira
Foto: Osmar Portilho / Terra

O passo é intenso, na medida do possível, até as portas do teatro, que tem 1600 lugares de capacidade. A repetição é igual nas três noites que o Rei se apresenta no navio.

Já instalados em suas poltronas, o fãs aguardam ansiosos. O burburinho é intenso. Quando a luz se apaga, inicia-se a catarse. O terno branco surge ao fundo do palco. O clima é de hipnose, que logo se transforma em um coro uníssono que só termina duas horas depois dali.

O show de Roberto Carlos passa longe de ser uma novidade para seus seguidores. O cantor segue rigorosamente a ordem das suas músicas e conta as histórias usando sempre as mesmas palavras. Em função de sua memória, ele tem aos seus pés, ao lado das caixas de retorno, monitores de teleprompter que exibem não só as letras das músicas, mas todas as informações que dão continuidade ao show. Roberto não esconde que usa a “cola” com frequência. Na era do playback, isto logo vira um detalhe ínfimo.

Emoções, Eu te Amo, te Amo, te Amo, Além do Horizonte, O Portão, Lady Laura, O Calhambeque, Detalhes, Proposta, Esse Cara Sou Eu, É Proibido Fumar

Canções que possuem um peso imensurável na vida de quem está ali. Muitas vidas dali se confundem com essas letras.

Senhores de terno com gravatas alinhadas deixam a pose de lado e choram.

Roberto Carlos se apresentou na noite dessa terça-feira (11) no último dia do cruzeiro 'Emoções em Alto Mar', que celebra sua décima edição
Roberto Carlos se apresentou na noite dessa terça-feira (11) no último dia do cruzeiro 'Emoções em Alto Mar', que celebra sua décima edição
Foto: Osmar Portilho / Terra

Neste reencontro de sensações boas e ruins, Roberto Carlos deixa escapar uma inversão de sentimentos em uma de suas canções mais famosas. "Eu fiz essa canção há muito tempo e com muita alegria. Hoje não posso dizer o mesmo. Não canto com alegria alguma, mas com muito amor", disse antes de Lady Laura, canção de 1978, sobre sua mãe, que morreu em 2010.

O clima de gala dura até a reta final do show.

Ao cantar Champagne, de Peppino di Capri, uma sequência de garçons entra com centenas de taças com a bebida para o brinde entre os fãs e Roberto Carlos. As poltronas são abandonadas, a parte da frente do palco tomada e o empurra-empurra dá banhos de champagne. Aqueles vestidos brilhantes cuidadosamente preparados agora estão amassados e encharcados.

A sequência final é brindada com Como É Grande o Meu Amor por Você e Jesus Cristo, para o apoteótico - e quase caótico – momento em que o cantor joga rosas para suas fãs.

Bengalas são deixadas para trás.

“Vai, vai, vai”.

Roberto Carlos se alterna ao entregar rosas nas mãos das felizardas e ao jogar para os locais mais afastados.

As mãos estendidas ao ar se estapeiam e destroem boa parte das rosas que são displicentemente beijadas pelo cantor antes do arremesso.

Quem consegue pegar seu troféu tenta imediatamente se desvencilhar do paredão de fãs que grita. O semblante na saída é de satisfação e dever cumprido.

A massa de pessoas – que agora já conta com jovens, senhoras, maridos, jornalistas e quem estiver por ali – se movimenta de acordo com a direção que cada rosa é jogada.

A despedida do Rei emociona, mas a madrugada está longe de ter fim. Já sob o domínio de punhos cerrados, as rosas são levadas carinhosamente para as cabines e ostentadas por todo o trajeto.

“Vou colocar ela na água mineral. Depois a gente volta e fica no cassino. Vai que ele resolve passar lá pra jogar”, continua aquela conversa do corredor.

Fonte: Terra
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